sábado, maio 31, 2008

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exercício de empobrecimento da rima - parte XXX.


estudo obsceno da poesia e o teatro - parte IV.

05.2008 - R.


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"... e quando eu te olho no espelho, eu fico vermelho. Um beijo".

narrador

Foi forte aquela carta, foi coisa pesada. A menina ficou estatelada, no banheiro, pelada, e só voltou à parada, só depois de umouduas talagadas numa velha cachaça já escassa, coitada, velhaça.


atriz seminua perambulando por um quarto, mãos na cabeça e as costas semi-cordundas, um papel na mão direita e, na esquerda, um gargalo.


narrador

Desgrudou do espelho o papel e pensou muito sério em bordel, nem pegou o chapéu - voz masculina em off, bem atormentada, ressequida, impostada, meio tremida, embaçada- "... e, meu bem, você sabe que eu nem sei bem quem, sei quem vem, só que isso não dá pra provar, porque aqui eu só tenho o pensar e, apesar de te amar, não vou nem suportar essa sina tão pobre, tão esnobe e verbal e moral, sexo anal, e o cigarro aqui aceso ao meu lado não vai me acalmar..." - narrador - porque se lembrou dessa frase com desbunde, sujou a saia.



narrador


Tomas Carlos estava pinel, só podia. Uma carta assim dessa valia, tamanha esquizofrenia, ele não fazia sentido, estava destrambelhado, perdido, acabado, e esse maldito inseto insensato ainda a deixou sem sapato no meio de um quarto tão desarrumado, que, coitado, se chovesse um bocado ficava enlameado, encharcado: os móveis começavam a se quebrar.


atriz sentada no meio da sala, saia branca rodada, véu e grinalda, olhando para cima e ouvindo o teto rachar - sonoplastia.


luz de trovão e barulho de raio pela janela - atenção, sonoplastia, atenção.


narrador

O primeiro a rachar foi um vaso italiano, feito em vidro de Murano, com um formato humano e que, se não me engano, lhe foi dado por Tomas Carlos - não era coisa de qualquer beltrano, vinha de gato escaldado. E agora, quem diria! Tomas estava abobado, lhe escrevera uma carta demasiado defasada, sem nem pé nem cabeça, sem nada - ou de novo: pelada.


nua, atriz deitada numa rede, pernas pendendo cada uma para o seu lado. não encostam no chão - em suas mãos, lê-se uma carta.


luz caprichada, afinada.


voz masculina em off, timbre de peito arfante

"... O que aconteceu ontem não foi digno de nota, nenhuma, além, é claro, além do obtuário, daquele canto escuro do jornal, onde o papel é semipreto e ele mancha, ele é cheio de câncer, é cheio de tubos, cheio de balas, de balas, oposto oeste da sua Coluna Sozzial.
Eu preciso de tempo! - música compassada e grave, soturna, até que surge uma flauta, aguda, afinada, restauradora - Me espanta... Ao menos tenta. Se desencanta, vê se se faz menos bela, perde o brilho, perde esse seu sorisso, e o canto do seu olho, e as ruguinhas, as ruguinhas do canto desse seu olho, o sorriso! E esse gosto de banho, o teu corpo castanho, cor de biquini, espontâneo, tão curvilíneo e mundano, cheiro de delícia, tato à le bacanal, minha menina linda, você não tem nome, você é homme".


a flauta some em um fade orgânico, sopro mais leve.

a atriz está encurralada entre móveis e a escada, com a maquiagem pesada inteira borrada.

a chuva some e a sala se faz clara. a atriz se levanta, o pescoço esticado, ela respira, mas fecha o olho, ela se retira e a cortina,


a cortina é fechada.


Trinta e três vivas à mais pura chanchada!

...

Um comentário:

Anônimo disse...

meodeo

2 comentários
mentira, 3.

você adora rima.
a imagem do blog está incompreensível.
ah, e você é bom! =)