quarta-feira, maio 16, 2007

Bocejo outonal

Os duendes, que faziam material de costura, papéis e o mata-borrão de Fernanda zanzarem como extraterrestres pela velha casa, são nas horas vagas os mestres do rock’n roll. A tese aqui é didática e simples, ou seja, um calafrio simpático para aqueles que gostam das ciências exatas: Roqueiro bom é roqueiro morto.


Só o pronunciar dessa frase fazia Cintra remexer as perninhas finas, chamadas já de flamingos em sua infância, do alto da cadeira velha de vime ruim. Pensava nos ícones unânimes das rodinhas de vinho tinto, nos nomezinhos certos do caderno bom do jornal, e dizia, com voz de pêra – “Não. Os roqueiros bons ainda estão vivos!”.


A resposta foi firme, fria e vaga, bem como uma vaca. Veio de um menino (como já o diria o avô Benvindo), que de sentado no fundo da sala tornou-se um bom linha de frente, dizendo com voz de adolescente:

- David Bowie, o tosco do Roger Watters, Caetano Veloso e a Hebe da Rita Lee. Bando de pentelhos no ralo, sovacos no ônibus. Se já foram algo, não são. Vãos velhos caretas de samba-canção, Domingão do Faustão (inclusive a Rita – n.a.).



E se em ônibus trânsito gera baderna, em bar frase vira guerra. Logo se levantou mais um, coroa careta bêbado, cara de cafeta enfezado no sábado (coisas de almoço em família):

- Se bobear ele tá é certo. É bom se já tá morto. Roqueiro envelhece e coloca botox, rugas aparecem e eles mudam a voz, o cabelo é do tom de casaco de avó. Os que preservam a loucura viram maracujás sacaneados, os que insistem cantando têm cara de advogados. A morte é o atestado.


Cintra hesitou. Chamou a xará, abraçou e bebeu; refletiu. Argumento quebrado, pensou na desculpa, o contorno forçado, e gritou: “Ah”...

... Foi interrompida por gnomo anil.


(continua)